segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

CASU 2 - Outono de 2011

Outra vez no Inverno, mas ainda em 2011, sai finalmente o segundo número dos CASU. Tal como se previa, este foi um ano de grande mudanças. O clima de crise estendeu-se a toda a "zona do euro", tendo os países do arco do mediterrâneo (Portugal, Espanha, Itália e Grécia) alterado a composição dos seus governos. Inicia-se portanto um novo ciclo político, muito pressionado para implementar difíceis reformas, no âmbito de um Estado social que parecia inquestionável e plenamente consolidado. A nível pessoal, concretizou-se uma súbita alteração de enquadramento. Quebrou-se um percurso iniciado já no século passado (!) e, ao mesmo tempo, surgiu a oportunidade de abraçar um projecto estimulante, sediado na margem esquerda do Mondego, onde participamos activamente no muito que está também por fazer.
Mas foi sobretudo a mudança de grau académico, defendendo a tese no dia das Letras Galegas (17 de Maio), que impediu a sequência imediata do primeiro número dos CASU. Ainda assim, na ausência de artigos da Primavera e do Verão, esta iniciativa tem o mérito de contribuir para a adesão a um projecto de publicação de manuais universitários, actualmente já em curso, de que daremos notícia em breve. Nestes textos de Outono, apresentam-se dois dos trabalhos em que estivemos empenhados nos últimos anos. No domínio da arquitectura, um projecto de habitação colectiva, hoje "à venda", que revela os problemas de planeamento existentes em Portugal e a falência de um sistema administrativo de controle burocrático dos processos, que não facilita o encontro das melhores soluções, em tempo útil. De igual modo, no domínio do ordenamento do território, a participação na equipa técnica de consultores para a revisão do plano da área metropolitana de Lisboa constitui uma experiência profissional que estará por concluir, através de uma metodologia de trabalho mais conseguida, tanto em termos políticos como técnicos.
Um terceiro artigo introduz um tema de grande actualidade, a necessidade de convergência entre o urbanismo e os transportes, do qual muito depende a sustentabilidade das nossas cidades. A qualificação da vida urbana em todos os seus âmbitos, onde o espaço que é público desempenha um papel fundamental, é também a leitura que propõe Isabel Costa Lobo, urbanista e geógrafa. A diversidade na formação dos autores destes textos (em 2.4 temos um esquema gráfico de um economista), será evidente na próxima edição dos Cadernos, onde se abordará igualmente a ligação entre urbanística e austeridade.
Que seja o lema para um bom 2012!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

2.1 - Habitação Colectiva em Sintra

O projecto de arquitectura deste edifício pretende em primeiro lugar cumprir o conceito de quarteirão, referido na memória descritiva do Loteamento Conjunto do Campus da UCP e Outros, em Sintra. Trata-se de um quarteirão em forma de U, em que o pátio é voltado a Norte e o topo edificado deverá ter a mesma altura que as duas bandas laterais, de 3 lotes cada uma. De acordo com o regulamento do loteamento, o edifício apresenta dois túneis de entrada para o seu interior, em lados opostos, sendo o acesso às habitações feito a partir do pátio.
Por questões de topografia, racionalidade construtiva e alinhamento de cérceas, estas entradas para o quarteirão estão situadas a meio da principal pendente, nas fachadas laterais, devidamente compatibilizadas com os portões de acesso dos automóveis para o estacionamento nos pisos inferiores. De facto, a funcionalidade do estacionamento, aliada ao cumprimento da profundidade de 12 metros nos pisos superiores, condicionou em grande medida todo o projecto. Uma vez que com entradas individuais em cada lote seria impossível de garantir o mínimo de 1 lugar por fogo, propõe-se uma entrada e uma saída comuns, no local mais favorável para todo o conjunto. Esta solução será certamente generalizada para todos os restantes quarteirões do loteamento, o que acabará por reforçar a leitura unitária que se pretende para cada edifício.
De forma a garantir a qualidade e a diversidade residenciais, houve também que ajustar algumas tipologias de habitação, reduzindo-se mesmo em vários lotes o número de fogos previsto inicialmente. A distribuição dos 63 fogos mantém no entanto a maioria de T2/T3, com 19 T3, 34 T2, 7 T1 e 3T0.

Projecto de Joaquim Novais, Rui Florentino e Andreia Pascoal.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

2.2 - A vivência do espaço público urbano

por Isabel Costa Lobo *


Como é vivido o espaço público urbano? Que formas tem? De que é que depende? Do espaço em si ou das pessoas? Pretende-se apenas apresentar uma forma de abordagem e um ponto de partida, para uma temática vasta e muito complexa, porque depende de muitos factores, palpáveis e não palpáveis, e de muitos intervenientes. É quase impossível “controlar-se” totalmente a “qualidade” da cidade e julgar que essa qualificação “dura” e fica terminada! Não só o espaço público muda, porque a cidade muda (funções, edificado, imagem), como os habitantes e utilizadores mudam (ficam mais velhos) e ainda se alteram os seus comportamentos, as suas necessidades, as suas exigências.
Escolheram-se em Lisboa 3 casos de estudo muito diferentes, tanto pela sua “idade” e história, como pelas funções e desenho urbano: a Graça, área mais antiga, com população mais envelhecida e zona histórica com monumentos; as Avenidas Novas, área plana e malha ortogonal, essencialmente de serviços, com uma população residente que regista decréscimos significativos; e Telheiras, área de urbanização mais recente, construída a partir de um Plano de Pormenor de conjunto, principalmente residencial e com uma população mais jovem.
Os dados, as observações e as análises feitas, na perspectiva exigível do rigor académico, sustentam uma intenção e uma convicção: a de que qualquer intervenção de Qualificação da Cidade, para ter êxito, deve apoiar-se numa “pedagogia” colectiva – ou seja, não é tão importante e é quase impossível de dizer objectivamente se uma cidade é “boa” ou é ”melhor” que outra – as pessoas no seu conjunto têm que aprender a viver na cidade, a sentir-se bem na cidade, a usufruir da cidade e a gostar da cidade.

* Licenciada em Geografia e Planeamento Regional; Mestre em Qualificação da Cidade.
** Fotografia de Carlota Costa Cabral.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

2.3 - Mobilidade e planeamento *

Em todas as recentes orientações para se conseguir um desenvolvimento mais sustentável do território, a articulação entre urbanismo e transportes é um dos temas mais recorrentes. Sabe-se que os modelos urbanos, tanto os existentes como os novos, condicionam em grande medida a utilização dos diferentes modos de transporte, favorecendo uns em detrimento de outros, em função dos usos do solo e das densidades de ocupação. A literatura da especialidade tem vindo pois a defender que é necessária a contenção da dispersão das actividades humanas no território, porque ela prejudica, ou inviabiliza mesmo nalguns casos, a utilização frequente do transporte público, ao contrário de uma cidade mais compacta, dita tradicional, que aproxima o acesso a todas as actividades, através da densidade e da mistura de usos.
O problema parece residir na forma como, sem se prescindir da qualidade de vida, alcançar o objectivo de aumentar a mobilidade urbana em meios menos consumidores de energia, tratando-se portanto de uma questão transversal, também de ordem política, económica e social. Não é pois de estranhar que o modo como os cidadãos se deslocam (em transporte colectivo, individual ou em modos suaves - a pé e de bicicleta) seja uma das preocupações fundamentais dos governos nacionais e locais, constituindo um dos indicadores de medição que a Comissão Europeia aconselha a monitorizar, no âmbito das Agendas 21 Locais, dada a contribuição do sector dos transportes para a poluição, o ruído e a emissão de gases com efeito de estufa.
Em termos gerais, pode-se dizer que a mobilidade sustentável é aquela que reduz a dependência do automóvel para as deslocações diárias e potencia a utilização dos modos colectivos e não motorizados. Ora, para tal é inquestionável a necessidade de controlar a expansão urbana, reabilitar a cidade existente e misturar os usos e grupos sociais, como factor de integração, aspectos que passam obviamente pelo ordenamento urbano e territorial. De facto, basta verificar a influência das linhas de transporte público na formação dos preços do imobiliário, para perceber que é essencial a avaliação dos impactes e das externalidades, recíprocos, entre a urbanização e a mobilidade.
Ainda hoje, trata-se de saber "até onde" a sociedade está disposta a fazer chegar o veículo a motor. As boas práticas são o planeamento das actividades urbanas em função "do andar a pé" e comportamentos responsáveis como a partilha dos meios de deslocação, que no seu conjunto contribuem para uma mobilidade mais saudável, com os conseguintes benefícios económicos, sociais e ambientais. O desenho dos espaços de circulação deve assim privilegiar as dimensões humanas, formando áreas pedonais alargadas, junto a percursos para bicicletas ou dedicados aos transportes públicos, em detrimento do espaço destinado ao automóvel particular. Os melhores exemplos demonstram que é possível aumentar a qualidade de vida reduzindo os movimentos pendulares diários.


* Por Rui Florentino. Texto desenvolvido no livro "Manual de Boas Práticas para uma Mobilidade Sustentável", coordenado e editado pela Agência Portuguesa do Ambiente (2010).

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

2.4 - Para uma nova abordagem à revisão do PROT-AML

O processo da proposta de revisão do Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROT-AML) é um exemplo para retirar ilações, visando melhorar as práticas de planeamento. A insatisfação com a implantação do Plano em vigor, desde 2002, apoiada pela decisão do anterior governo em localizar um futuro aeroporto na margem Sul, motivou a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo a iniciar, ainda em 2008, uma revisão desse instrumento de desenvolvimento estratégico para a região capital.
Contudo, a metodologia utilizada não conduziu a um melhor documento que o anterior, mantendo-se bloqueada a convergência de interesses entre a administração local e os serviços de ordenamento da administração central. Perante os problemas de governabilidade com que se depara a região, a experiência demonstra que devem ser introduzidas reformas progressivas no desenho institucional, em simultâneo com práticas inovadoras nos domínios do planeamento e da identificação com a escala metropolitana. As principais transformações desejáveis passam então por medidas em termos de enquadramento regulamentar, coordenação e governança, através de duas ideias-chave:
  • A promoção de uma governação mais participada, com base no crescimento do capital social da região, num quadro de competências tendencialmente mais estabilizado e numa estratégia territorial que seja melhor compreendida pelos diferentes actores públicos e privados.
  • A construção de uma liderança política mais articulada, que emerge da cidade capital e se desenvolve nas duas margens, sendo capaz de mobilizar recursos financeiros e concretizar projectos estratégicos supra-municipais, com o apoio do governo.

Artigo de Rui Florentino. Desenho de Álvaro Nascimento, Coordenador dos estudos de economia na proposta de revisão do Plano.