quinta-feira, 13 de março de 2014

9.1 - Uma arquitectura sobre região - cultura arquitectónica na Galiza contemporânea


Na sequência da recepção de um texto de Paul Ricouer, o “Civilização Universal e Culturas Nacionais”, original de 1955 e que, segundo Frampton, propõe «a tese de que uma cultura mundial híbrida só chegará a existir através de uma fecundação entre a cultura enraizada, por um lado, e a civilização universal por outro» o paradoxo, em arquitectura, era desmontar a tendência contemporânea para a internacionalização, recriando a memória dos elementos arquitectónicos locais, sem abandonar, contudo, o mesmo carácter progressista dos movimentos modernos.
Em Portugal, notaram-se também algumas obras de inspiração regional, em particular quando os arquitectos englobaram no seu exercício profissional as conclusões do citado Inquérito, que promoveram com grande entusiasmo. Todavia, por razões compreensíveis, a cultura arquitectónica estava sobretudo empenhada em acompanhar a transição política para a democracia, após 1974, eliminando o passado colonialista do Estado Novo, já que tudo o que pudesse significar desenvolvimento económico e social, constituiria um trunfo para a formação do “país moderno”. Tais compromissos políticos e sociais não foram, de resto, totalmente incompatíveis com interessantes projectos de vocação e espírito regional. De facto, as leituras já existentes da arquitectura portuguesa contemporânea, tão rica e contraditória ao longo do passado século, de Raul Lino a Álvaro Siza, só provam que muitas outras podem ainda desenvolver-se nesse mesmo tema. Porém, não encontramos em Portugal motivos suficientes para pensar numa arquitectura sobre região, o que nos impede de elaborar aqui a possível ideia de “região arquitectónica”.
Pelo contrário, uma investigação sobre cultura arquitectónica no âmbito da “Galiza contemporânea”, dando sentido àquela ideia no mesmo momento em que esta era pós-moderna avança, também sem receios, para a “hipotética globalização cultural”, parece ser pelo menos pertinente. Passados os “Séculos Escuros” (assim denominado o lapso de tempo, após a Idade Média, em que se apagam os valores culturais da região), é somente a partir da segunda metade do século XIX que se forma no “povo galego” uma consciência “para si”, de afirmação e identidade. Segundo diversos autores, a data de 1863, na qual se publica novamente uma obra literária escrita em galego (“Cantares Gallegos”, de Rosalía de Castro), é particularmente importante para se definir o início da época contemporânea na Galiza. Numa primeira modernidade, recriam-se os seus valores históricos, de individualidade cultural e especificidade ambiental, mas depois a crise económica, a sucessiva emigração e, em particular, a guerra civil entre 1936 e 39 e o regime que se lhe seguiu, travam o desenvolvimento daquele ressurgimento moderno, embora situado. As vanguardas artísticas do início do século, mesmo desde o exílio, retomaram o processo de afirmação social e cultural, mas só recentemente a nova situação política em Espanha, com a instituição das Autonomias, permitiu definir o tempo de uma segunda modernidade para a Galiza.
A presente dissertação elabora pois sobre a época contemporânea desta região histórica, entendida através da actividade de um grupo significativo de profissionais que, sobretudo após a fundação do Colexio Oficial de Arquitectos de Galicia (COAG), em 1973, estudou e construiu a singularidade arquitectónica da Galiza.
 
 

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