quarta-feira, 19 de junho de 2013

7.1 - Arquitectura Popular nos Povoados do Alentejo *

por José Baganha **

Neste ensaio aprofundam-se os conhecimentos sobre a matéria de estudo, na senda de uma melhor, mais completa e fundamentada compreensão da singularidade tipológica das construções ditas «populares», nos seus vários aspetos e nas suas várias expressões de local para local, com diversidades por vezes muito subtis mas também muito interessantes, e ainda, da relação ou interdependência do espaço construído (privado) e do espaço livre (público) – dependência recíproca ou relação indissociável, que forma um todo coerente e singular.
Considerando que a ocupação urbana do território compreende, em termos formais, dois elementos fundamentais: a estrutura edificada e os espaços livres (exteriores), formados pelas áreas de circulação e estadia - ruas, praças e largos – e restantes espaços não construídos públicos ou privados, teremos que o carácter, a identidade, de um determinado povoado resulta da distribuição relativa dos diversos espaços, bem como da sua articulação e da arquitectura dos seus edifícios. O objetivo aqui contido, neste estudo, é o de usar toda esta singularidade cultural, este manancial riquíssimo, nas intervenções que hoje fazemos nessas aldeias, nos montes, nas vilas, nas cidades, a nível urbanístico ou arquitetónico, com uma abordagem culta, nova, sem preconceitos ideológicos mas profundamente ecológica.
É hoje, aliás, universalmente aceite que a Cidade (no sentido mais lato do termo) constitui o tema número um no que diz respeito à sustentabilidade ambiental; A cidade é a base dos três pilares do desenvolvimento sustentável – o físico, o ambiental e o económico. Há portanto que estudar a sua forma, a sua estrutura, de região para região, atendendo aos aspetos particulares. E isso passa, não há dúvida, também, por uma Cidade mais humanizada, por intervenções mais sustentáveis no domínio do urbano, da arquitetura e da construção, procurando aquelas soluções, por vezes tão simples, tão empíricas, que sempre estiveram ao nosso alcance, que parece pertencerem a um determinado lugar e a nenhum outro, como que «brotando da terra», concentrando o engenho do Homem, a evolução, a invenção, no respeito pelo arquétipo, assumindo “a identidade do lugar como condição para a identidade do Homem” (Irene Ribeiro, 1993).
Perante um cenário mais ou menos previsível e bastante provável de descaracterização e desqualificação ambiental, que os fenómenos da globalização e do turismo de massas poderão vir a gerar nesta região, como noutras do Sul da Europa, parece evidente e até urgente que se possam encontrar soluções que permitam viabilizar novos investimentos e gerar mais bem estar para as populações locais, sem perda de identidade. É também nesta perspetiva operativa, dinâmica e não estática ou museológica, que me propus empreender este estudo.
O objectivo deste trabalho é, portanto, o de providenciar um conhecimento tão completo quanto possível das tipologias urbanas e da arquitectura popular dos povoados da região do Alentejo português, incluindo também como que um conjunto de informações ou uma análise tipológica que permita aos diversos agentes que intervêm no território, mais especialmente nestes pequenos aglomerados urbanos, mas também nas cidades da região, actuar com o sentido de preservação da singularidade local, respeitando, independentemente das questões de estilo, essa(s) unidade(s) tipológica(s) nos aspectos relacionados com a arquitectura, mas também nos do desenho urbano.
O meu entendimento nestas matérias e o meu objectivo neste trabalho é, assim, o de um estudo operativo, que permita recolher dos ensinamentos do passado – nos aspectos construtivos, da composição, da forma, das razões e dos processos – tudo quanto possa constituir uma vantagem, uma melhoria, uma boa solução para os problemas que hoje se colocam – de preservação de identidade cultural e de natureza ambiental – para que possamos deixar às gerações vindouras um futuro mais risonho e uma lembrança, uma memória, do essencial da sua história, da sua cultura, dos seus costumes e tradições, preservando o significado ou a razão da sua existência, naquilo que a diferencia de outros povos, de outras regiões, de outras culturas.
Trata-se portanto de um trabalho com claros objectivos operativos, um estudo metodológico, se quisermos, e não um mero rol ou levantamento exaustivo, de tom saudosista ou melancólico, para «arrumar» ou «guardar» museologicamente certos lugares, ou certos edifícios, mais preservados, despojando-os muitas vezes de vida própria e de sentido de existir.


* Excerto do título da Tese de Doutoramento de José Baganha, orientada pelo Prof. Javier Cenicacelaya e apresentada na Escola de Arquitectura do País Basco, em 2012.
** José Baganha Arquitectos Associados.

Sem comentários:

Enviar um comentário