A Assembleia da República agendou para 19 de Julho de 2017 a votação em plenário de duas iniciativas legislativas, a saber: Petição n.º 119/XIII/1.ª “Em Defesa do Exercício da Profissão de Engenheiro” e Projecto de Lei n.º 495/XIII do PSD, Segunda Alteração à Lei n.º 31/2009 de 3 de Julho, com o objectivo de permitir que ALGUNS engenheiros possam realizar projectos de Arquitectura. Ambas representam uma pretensão politicamente anacrónica e contra ambas pendem argumentos jurídicos que aconselham seriamente os Senhores Deputados a votarem contra:
1. A estabilidade jurídica é um valor em si mesmo, e ao interferir no presente momento com o processo legislativo em curso iniciado com a aprovação da Lei n.º 31/2009 de 3 de Julho e que deverá ficar concluído com o fim do período transitório a 1 de Novembro de 2017, vai o Parlamento atentar contra o Princípio da Confiança, o Princípio da Igualdade e vai ainda promover a sucessiva desregulação do quadro jurídico que se encontra estável como veremos.
2. A directiva comunitária na qual se baseiam para se constituírem como EXCEPÇÃO em relação aos demais engenheiros e engenheiros técnicos, destina-se a reconhecer qualificações nos OUTROS estados-membro e não no estado-membro de origem, conforme BEM EXPRESSO nas Disposições Gerais da mesma.
3. A alegada perda de DIREITOS ADQUIRIDOS e a alegada quebra do Princípio da Confiança por parte do Estado Português aquando da publicação da Lei n.º 31/2009 são argumentações falaciosas pois se de facto “‘O princípio do Estado de direito democrático, consagrado no art. 2.º da CRP, postula uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da continuidade da ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas (…)’, pelo que a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar terá de ser entendida como não consentida pela Constituição (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 303/90, entre muitos)”, TAMBÉM, “(…) o cidadão deve poder prever as intervenções que o Estado poderá levar a cabo sobre ele ou perante ele e PREPARAR-SE PARA SE ADEQUAR A ELAS (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 17/84, em ‘Acórdãos do Tribunal Constitucional’, 2.º Vol. P. 375)”. Quer isto dizer que a argumentação relativa a direitos adquiridos poderia ter lugar SE, E SÓ SE, não tivesse sido consagrado na lei o PERÍODO TRANSITÓRIO que efectivamente foi.
4. Ao contrário, caso viesse a aprovar as pretensões patentes no Projecto de Lei n.º 495/XIII, o Estado Português estaria a quebrar o PRINCÍPIO DA CONFIANÇA, porquanto ao abrigo do Período Transitório estipulado na Lei n.º 31/2009 muitos engenheiros actualizaram a sua formação fazendo o curso de Arquitectura para se inscreverem na Ordem dos Arquitectos e poderem realizar actos próprios e exclusivos de Arquitectos.
5. Mais ainda, caso viesse a aprovar as pretensões patentes no Projecto de Lei n.º 495/XIII, o Estado Português estaria a violar o PRINCÍPIO DA IGUALDADE consagrado na Constituição da República relativamente a todos os engenheiros cujos cursos são em tudo equivalentes aos mencionados na directiva mas cujos anos de referência aquela não inclui. Seria tratar de forma distinta aquilo que é igual.
6. A recomendação do Provedor de Justiça, n.º 2/B/2015, na qual ambas as iniciativas legislativas se baseiam, dá conta de desconformidade jurídica que deveria ser sanada através de “acto de vontade parlamentar”, por não ter o Provedor ao seu alcance outra forma de a sanar. Porém, essa desconformidade existe apenas e só porque AINDA DECORRE o período transitório previsto na Lei n.º 31/2009, que termina a 1 de Novembro de 2017, podendo a partir dessa data o Governo proceder à alteração do anexo VI da directiva comunitária que é precisamente a origem da desconformidade, e assim automaticamente saná-la.
7. Na redacção da proposta de alteração à lei é confundido o grau académico de “detentor de curso de engenharia civil” com o título de “engenheiro civil”. A consequência jurídica é a criação de novas desconformidades no actual quadro legislativo que regula as profissões da construção, porque para o titular de um curso poder exercer uma profissão regulada tem de o fazer sob determinadas condições que o Projecto de Lei n.º 495/XIII não especifica, designadamente todo o enquadramento deontológico.
8. Tal como é proposta esta alteração à lei, devolvem-se privilégios apenas a ALGUNS engenheiros civis, mas ALARGA-SE DESMESURADAMENTE esses mesmos privilégios, sobre competências que os mesmos NUNCA tiveram. Não se trata de “voltar ao quadro jurídico anterior à Lei n.º 31/2009”, no qual os engenheiros civis podiam elaborar ALGUNS projectos de Arquitectura. Com esta redacção passam a poder elaborar TODOS. Incluindo remodelar o Mosteiro dos Jerónimos, por exemplo.
Sendo certo que o que aqui está em causa é a vontade política, da construção de um país mais qualificado para o futuro, não devem também os Senhores Deputados deixar de atender a estes argumentos que aconselham o voto desfavorável.
Daniel Fortuna do Couto
Vice-Presidente do Conselho Directivo Nacional da Ordem dos Arquitectos
5 de Julho de 2017
1. A estabilidade jurídica é um valor em si mesmo, e ao interferir no presente momento com o processo legislativo em curso iniciado com a aprovação da Lei n.º 31/2009 de 3 de Julho e que deverá ficar concluído com o fim do período transitório a 1 de Novembro de 2017, vai o Parlamento atentar contra o Princípio da Confiança, o Princípio da Igualdade e vai ainda promover a sucessiva desregulação do quadro jurídico que se encontra estável como veremos.
2. A directiva comunitária na qual se baseiam para se constituírem como EXCEPÇÃO em relação aos demais engenheiros e engenheiros técnicos, destina-se a reconhecer qualificações nos OUTROS estados-membro e não no estado-membro de origem, conforme BEM EXPRESSO nas Disposições Gerais da mesma.
3. A alegada perda de DIREITOS ADQUIRIDOS e a alegada quebra do Princípio da Confiança por parte do Estado Português aquando da publicação da Lei n.º 31/2009 são argumentações falaciosas pois se de facto “‘O princípio do Estado de direito democrático, consagrado no art. 2.º da CRP, postula uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da continuidade da ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas (…)’, pelo que a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar terá de ser entendida como não consentida pela Constituição (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 303/90, entre muitos)”, TAMBÉM, “(…) o cidadão deve poder prever as intervenções que o Estado poderá levar a cabo sobre ele ou perante ele e PREPARAR-SE PARA SE ADEQUAR A ELAS (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 17/84, em ‘Acórdãos do Tribunal Constitucional’, 2.º Vol. P. 375)”. Quer isto dizer que a argumentação relativa a direitos adquiridos poderia ter lugar SE, E SÓ SE, não tivesse sido consagrado na lei o PERÍODO TRANSITÓRIO que efectivamente foi.
4. Ao contrário, caso viesse a aprovar as pretensões patentes no Projecto de Lei n.º 495/XIII, o Estado Português estaria a quebrar o PRINCÍPIO DA CONFIANÇA, porquanto ao abrigo do Período Transitório estipulado na Lei n.º 31/2009 muitos engenheiros actualizaram a sua formação fazendo o curso de Arquitectura para se inscreverem na Ordem dos Arquitectos e poderem realizar actos próprios e exclusivos de Arquitectos.
5. Mais ainda, caso viesse a aprovar as pretensões patentes no Projecto de Lei n.º 495/XIII, o Estado Português estaria a violar o PRINCÍPIO DA IGUALDADE consagrado na Constituição da República relativamente a todos os engenheiros cujos cursos são em tudo equivalentes aos mencionados na directiva mas cujos anos de referência aquela não inclui. Seria tratar de forma distinta aquilo que é igual.
6. A recomendação do Provedor de Justiça, n.º 2/B/2015, na qual ambas as iniciativas legislativas se baseiam, dá conta de desconformidade jurídica que deveria ser sanada através de “acto de vontade parlamentar”, por não ter o Provedor ao seu alcance outra forma de a sanar. Porém, essa desconformidade existe apenas e só porque AINDA DECORRE o período transitório previsto na Lei n.º 31/2009, que termina a 1 de Novembro de 2017, podendo a partir dessa data o Governo proceder à alteração do anexo VI da directiva comunitária que é precisamente a origem da desconformidade, e assim automaticamente saná-la.
7. Na redacção da proposta de alteração à lei é confundido o grau académico de “detentor de curso de engenharia civil” com o título de “engenheiro civil”. A consequência jurídica é a criação de novas desconformidades no actual quadro legislativo que regula as profissões da construção, porque para o titular de um curso poder exercer uma profissão regulada tem de o fazer sob determinadas condições que o Projecto de Lei n.º 495/XIII não especifica, designadamente todo o enquadramento deontológico.
8. Tal como é proposta esta alteração à lei, devolvem-se privilégios apenas a ALGUNS engenheiros civis, mas ALARGA-SE DESMESURADAMENTE esses mesmos privilégios, sobre competências que os mesmos NUNCA tiveram. Não se trata de “voltar ao quadro jurídico anterior à Lei n.º 31/2009”, no qual os engenheiros civis podiam elaborar ALGUNS projectos de Arquitectura. Com esta redacção passam a poder elaborar TODOS. Incluindo remodelar o Mosteiro dos Jerónimos, por exemplo.
Sendo certo que o que aqui está em causa é a vontade política, da construção de um país mais qualificado para o futuro, não devem também os Senhores Deputados deixar de atender a estes argumentos que aconselham o voto desfavorável.
Daniel Fortuna do Couto
Vice-Presidente do Conselho Directivo Nacional da Ordem dos Arquitectos
5 de Julho de 2017
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