por Rui Florentino
No quadro
europeu, as políticas e opções de ordenamento do território são um domínio
quase exclusivo de cada Estado, um dos âmbitos de competência que os países
mantêm em elevada atenção, quando em muitas outras áreas são confrontados com
poderes de decisão internacionais. O território pode ser entendido quase como
um dos últimos redutos da soberania nacional, merecendo por isso valorizar-se,
enquanto factor de competitividade. Mas é habitual falar-se em grande desordenamento,
que nas nossas cidades, vilas e aldeias impera a ausência de planeamento, a
descaracterização da paisagem e do que importa preservar, desprezando-se a
qualidade do património territorial. Ora, é porque não temos competências
técnicas neste domínio ou por questões culturais e de administração pública?
Seja qual for a razão, porque há muitas, conforme os contextos e as
perspectivas de análise, existem profissionais que se ocupam de que as coisas
não estejam ainda piores. Estes técnicos, como eu, são conhecidos por Urbanistas,
embora possam ser formados em arquitectura, engenharia, geografia, direito e outras
áreas do conhecimento.
Já no início
dos anos 80 os Urbanistas reconheceram a necessidade de formar uma classe
profissional, não por motivos corporativos, de protecção do trabalho, mas para
defender uma disciplina que requer métodos próprios e é política pública que se
reconhece como essencial para a qualidade de vida de todos os cidadãos. Foi
assim constituída a Associação dos Urbanistas Portugueses, que passados 30 anos
está em vias de poder crescer, de acordo com o aumento dos técnicos que
participam nas actividades de planeamento e gestão do território. Não parece
contudo que se venha a formar uma nova Ordem profissional, regulamentando ainda
mais um sector que já está tão sobrecarregado de legislação. De facto, a
experiência diz-me que é mais na esfera dos processos de decisão e nas teias
burocráticas do Estado que as coisas poderiam melhorar. A administração pública
protege-se a si própria, desgastando o investimento privado com
irracionalidades processuais, que impedem uma gestão do território mais
elegante e eficaz.
Não se
compreende por exemplo que as cíclicas revisões dos diplomas sobre os planos de
ordenamento façam manter a designação de Planos de Urbanização, quando se sabe
que o que precisamos é de reabilitação, seja ela reabilitação urbana ou a
reabilitação da paisagem. Tal como não se percebe porque temos uma designação
minimalista do solo, que é urbano ou é rústico, complicando a adopção de
soluções integradas, que qualificam a paisagem humanizada do Norte de Portugal.
Se existe sector em que a legislação não tem porque “correr atrás do prejuízo”
é o da gestão do território, porque os diagnósticos são conhecidos há muito. Os
Urbanistas sabem que fazem falta ao país, sobretudo em condições adversas, e
por isso defendem a valorização da actividade de planeamento, nas suas várias
escalas e dimensões.
Nos seus editoriais o João Pedro Costa levanta a ponta do véu, sem
receios de mudança, mas sempre de forma educada. Esse é o espírito que nos
caracteriza e continuaremos a promover em todas as acções. A Associação dos
Urbanistas Portuguesas desenvolve neste momento um processo que fomenta a
diversidade da experiência profissional, porque há diferentes níveis de
responsabilidade e competência, daqueles que coordenam, dos que participam em
estudos sectoriais e dos que completam formações de base. É um processo
inclusivo, que visa a qualificação de todos os profissionais que trabalham no
planeamento e na gestão do território, repito, sejam eles arquitectos,
engenheiros, geógrafos, juristas ou outros. Para que a sociedade possa
reconhecer e valorizar uma actividade técnica que muito tem contribuído para a
sustentabilidade do nosso território, ajudando a caracterizar o desenvolvimento
económico e social.
* texto que será incluído no livro do Prof. João Pedro Costa "Pensar a cidade, 2005-2015. A crítica da crítica".
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