Após a recente aprovação em Conselho de Ministros dos diplomas sobre os apoios aos créditos bancários e às rendas habitacionais, terminou na semana passada o período de consulta pública relativo às restantes medidas apresentadas do pacote + Habitação, que exigem a aprovação da Assembleia da República. Contudo, o suporte parlamentar ao governo faz com que as propostas formuladas fiquem somente dependentes da decisão de promulgação ou não do Presidente da República.
Este artigo cinge-se à única medida que pareceu consensual entre os
partidos políticos, relativa à anunciada simplificação dos procedimentos
administrativos de licenciamento das operações urbanísticas, prevendo a
alteração e o aditamento de alguns artigos aos Regimes Jurídicos dos
Instrumentos de Gestão Territorial e da Urbanização e Edificação. A principal
mudança para o sector do urbanismo e da construção, e para as Câmaras
Municipais, refere-se ao licenciamento dos projetos de arquitetura e das especialidades
de engenharia, que poderiam assumir todos eles a forma de comunicação prévia,
“o que determina o deferimento liminar do procedimento”, com base nos Termos de
Responsabilidade dos projetistas, legalmente exigidos.
Quanto às especialidades de engenharia, a dispensa de apreciação
municipal já ocorre hoje com frequência, mas no que diz respeito à aprovação
dos projetos de arquitetura estaremos perante uma grande alteração de
paradigma, ficando assim o ónus de cumprimento das exigências legais aplicáveis
definitivamente do lado dos arquitetos, autores e coordenadores, que assinam
nesse sentido os respetivos Termos de Responsabilidade. O controlo da
legalidade passará então para um momento posterior de fiscalização de obra,
sabendo-se a diversidade de situações entre os municípios portugueses, muitos
deles com uma grande dimensão territorial, mas sem os meios humanos associados
para satisfazer tal missão.
Em consonância com esta proposta de simplificação administrativa do
licenciamento, há muito reclamada pelos agentes do sector, o governo quer
estabelecer um regime de responsabilidade solidária entre os projetistas e as
entidades executantes, que serão proprietários, promotores e empresas de
construção. Embora falte saber o modo de concretização, bem como as sanções a
aplicar por eventuais incumprimentos legais, consideramos de saudar a audácia
em procurar a reforma de um procedimento que nas últimas décadas penalizou a
oferta de habitação, com os custos económicos e sociais que são conhecidos.
No entanto, para que esta medida possa obter os resultados pretendidos, importará acautelar dois aspetos fundamentais. Os projetistas sabem que temos atualmente mais de 2 mil diplomas técnicos sobre urbanismo e construção, que variam consoante os diferentes usos dos edifícios, pelo que em simultâneo a esta medida de simplificação é preciso refundar toda essa legislação em dois códigos operativos. De igual modo, embora exista um sistema legal único para todo o país, os regulamentos da administração local hoje em vigor fazem com que, quanto normas e modos de submissão de projetos, há o mesmo número de procedimentos a respeitar do que de municípios portugueses. Ora, também aqui se exige uma uniformização processual, pelo menos à escala de coordenação e desenvolvimento regional.
Estamos sem dúvida num momento de inegável urgência, mas só uma reforma mais abrangente, incluindo o Urbanismo, permitirá que esta lei cartaz seja bem aplicada. É desejável que o debate parlamentar produza esse efeito.
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